Audiência Pública discute regularização fundiária do Quilombo da Rasa

Por Cezar Guedes em 24/09/2024 às 10:21:09
 Foto: Ascom/Justiça Federal

Foto: Ascom/Justiça Federal

A regularização fundiária do Quilombo da Rasa, em Búzios, reuniu em uma audiência pública o Ministério Público Federal (MPF), a Advocacia-Geral da União (AGU) e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). O objetivo da audiência pública, conduzida pela 1ª Vara Federal de São Pedro da Aldeia (RJ), foi discutir o direito dos quilombolas à propriedade daquelas terras. O evento foi realizado na tarde da última quinta-feira, 19 de setembro, na Praça Quilombola, em Búzios, com a participação de cerca de 100 pessoas da comunidade quilombola.

Pelo acordo, o Incra se comprometeu a cumprir todas as etapas do plano de ação, apresentando parecer e minuta de decreto até janeiro de 2026. A autarquia se propôs ainda a relacionar a lista das matrículas de propriedade que constam no processo para expedição de ofícios ao Registro Geral de Imóveis. A proposta do MPF de averbação de ação civil pública no registro de imóveis e no cadastro do IPTU do imóveis abrangidos foi acolhida, assim como foi determinada a intimação do município de Búzios para fiscalizar a ocorrência de invasões e novas construções, além de não emitir licenças para novos loteamentos no território objeto da ação.

Durante o evento, o procurador da República Leandro Mitidieri alertou que, apesar da Região dos Lagos ser a região com mais terras quilombolas no Rio de Janeiro, apenas uma delas foi titulada até agora. "Se continuarmos nesse ritmo, a regularização das terras quilombolas vai durar mais de 100 mil anos porque são 1.200 processos abertos", alertou Mitidieri. Ele ainda ressaltou a necessidade de aumentar o orçamento destinado à regularização fundiária, mencionando que em alguns momentos o valor disponível foi de apenas R$ 10 mil, o que classifica de "racismo estrutural orçamentário".

A juíza federal Mônica Lúcia ressaltou os entraves nos processos de regularização fundiária, mencionando a falta de dados e a burocracia excessiva como fatores que atrasam as soluções. Ela enfatizou ainda a importância de facilitar a comunicação entre a comunidade e o Judiciário por meio de audiências públicas, que podem acelerar a resolução de problemas. Por sua vez, a superintendente regional do Incra, Maria Lucia de Pontes, acredita que a audiência ajudou a desenrolar o processo de uma maneira mais rápida. "É um exemplo de como a Justiça pode ser efetiva e democrática.
Adriano Gonçalves, da Associação da Comunidade Remanescente de Quilombo da Rasa, comemorou o resultado da audiência. "Esse processo, que já dura 20 anos, é muito extenso, mas demos um grande passo. As pessoas que vieram aqui estão esperando essa titulação com muita expectativa. É um sonho de toda a comunidade", declarou.

Ação civil pública – No ano passado, a Justiça Federal havia determinado ao Incra, no âmbito da ação civil pública movida pelo MPF, que apresentasse, no prazo de 60 dias, cronograma de trabalho com a especificação das etapas pendentes e prazos para demarcação, desintrusão e titulação dos territórios quilombolas da comunidade da Rasa. O Incra também deveria observar o prazo máximo de 24 meses para a conclusão de todas as etapas.

A ação do MPF teve origem em procedimento administrativo instaurado para acompanhar o processo de demarcação das terras da comunidade quilombola da Rasa, iniciado na década de 1990. A demarcação foi formalizada em 2004, por meio de procedimento administrativo do Incra, mas até hoje não foi concluída.

De acordo com a ação, embora decorridos quase 20 anos, o processo administrativo do Incra ainda se encontra na fase de contraditório e análise das contestações apresentadas ao Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID), sem a finalização da identificação e titulação do território da comunidade quilombola. Para o MPF, essa é uma clara afronta ao princípio constitucional da duração razoável do processo, que sujeita a comunidade à violação do direito constitucional fundamental de ter reconhecida a propriedade sobre as terras.



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