Prefeito Carlos Augusto e secretário de saúde Fábio Simões exibem coração, mas esquecem de mostrar empatia pelos servidores
A saúde pública de Rio das Ostras está doente. Mas, ao contrário do que se espera de um sistema que deveria cuidar da vida de seus cidadãos, a enfermidade não está apenas nas doenças que atingem a população. Está, também, e de forma brutal, na forma como os profissionais de saúde do município estão sendo tratados.
O recém-publicado Decreto Municipal nº 4266/2025, assinado pelo prefeito Carlos Augusto Balthazar, determina o aumento da carga horária mínima dos plantonistas da saúde para 176 horas mensais — sem oferecer nenhum tipo de benefício, compensação financeira ou estrutura adequada para lidar com o novo acúmulo de trabalho. A medida, que já havia sido adotada anteriormente por esse mesmo gestor em sua gestão passada, em 2017, ressurge agora em um cenário ainda mais frágil e exausto.
Não é exagero afirmar que esse novo decreto representa um retrocesso inaceitável, uma afronta à dignidade dos servidores públicos da saúde. É como se a prefeitura, ao invés de reconhecer o esforço cotidiano dos profissionais da linha de frente, optasse por tratá-los como peças substituíveis de uma engrenagem que não merece descanso, reajuste ou respeito.
Trabalhar mais, ganhar o mesmo (ou menos)
A lógica administrativa por trás do decreto é insustentável: exige-se mais — muito mais — de quem já trabalha no limite do exaustivo, sem oferecer o mínimo de contrapartidas. A categoria dos fiscais sanitários foi uma das primeiras a se manifestar publicamente contra a decisão, apontando o que todos já sabiam, mas muitos ignoravam: as condições de trabalho são precárias, os salários são irrisórios e a sobrecarga pode levar ao colapso físico e mental dos servidores.
Como aceitar que um fiscal sanitário ganhe um salário-base de R$ 1.500, seja obrigado a cumprir plantão noturno e ainda precise, no exercício de sua função, agir ora como motorista, ora como vigia da sede da Secretaria Municipal de Saúde? Essa é a realidade em Rio das Ostras. Um retrato da negligência institucional e da falta de planejamento que atravessa anos e administrações.
Infraestrutura decrépita e desrespeito institucional
Não estamos falando apenas de um aumento de carga horária — o decreto é apenas o sintoma mais recente de uma doença crônica que afeta o serviço público local: o desmonte gradual da infraestrutura e da dignidade do servidor. Em pleno 2025, fiscais administrativos precisam dividir um único computador em um espaço improvisado que serve, ao mesmo tempo, como sala de reuniões, refeitório e cozinha. As cadeiras estão quebradas, o mobiliário não atende às necessidades mínimas, e os equipamentos são insuficientes para qualquer tipo de atividade que exija eficiência.
E o acesso à formação e educação continuada dos plantonistas? Inexistente. Como desenvolver políticas públicas eficazes de vigilância sanitária — ou manter qualquer padrão técnico de qualidade — sem sequer dispor de um computador por servidor durante o plantão?
Esse retrato revela muito mais do que um decreto — revela uma gestão que confunde autoridade com autoritarismo, e que acredita que o esforço humano é um recurso inesgotável.
O risco do colapso não é ameaça, é consequência
Com a publicação desse decreto, os corredores das unidades de saúde ecoam rumores de uma possível paralisação. Caso aconteça, não será um ato irresponsável dos trabalhadores, como argumentam certos discursos que tentam criminalizar os movimentos reivindicatórios, mas sim uma resposta proporcional à crise imposta pelo próprio poder público.
A paralisação de servidores da saúde deve ser vista como um grito de socorro, um limite ultrapassado, um alerta visível de que o sistema entrou em colapso. Em vez de solucionar os problemas, a atual gestão tem alimentado o caos com medidas arbitrárias, descaso e promessas nunca cumpridas. É impossível esquecer que, em 2017, ano em que Carlos Augusto também aumentou a carga horária do setor, os servidores ouviram promessas de valorização que jamais saíram do papel.
Quando fingem que governam, o povo paga a conta — e os servidores também
A saúde de Rio das Ostras não carece apenas de investimento. Precisa, sobretudo, de respeito. De políticas humanizadas, de diálogo com os profissionais que conhecem de perto os problemas do sistema. O decreto 4266/2025 é antítese disso tudo: foi feito sem ouvir os trabalhadores, sem transparência, sem projeção de impactos reais sobre a qualidade dos serviços prestados à população.
Estamos diante de mais um caso onde a gestão pública falha em seu compromisso social e ético. Um gestor que exige mais sem dar condições mínimas de trabalho não promove eficiência: promove exaustão. Não promove compromisso: promove abandono.
É preciso dizer, sem rodeios: os profissionais da saúde de Rio das Ostras não pedem privilégios. Exigem o mínimo: carga horária justa, salário digno e estruturas básicas para exercerem seu ofício. Nada mais. E isso já seria revolucionário, diante do que têm enfrentado.
Essa crise escancarada pelo decreto não é resultado de emergência financeira, mas sim de escolhas políticas. E toda escolha tem consequência. Que a atual administração esteja, então, preparada para as que virão.
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