MP acusa prefeito de Arraial do Cabo de "chefe de organização criminosa"

Por Cezar Guedes em 10/10/2020 às 14:00:24

Renato Martins Vianna (foto), prefeito de Arraial do Cabo é líder de Organização Criminosa. A denúncia é do Ministério Público que em julho deste ano enviou ao 2º Grupo de Câmaras Criminais do Tribunal de Justiça (TJ-RJ) pedido de concessão de busca e apreensão no endereço de Renatinho e dos demais integrantes da organização.

Os integrantes da quadrilha, segundo o órgão acusatório, são: Carlos Roberto da Silva, o "Pica-Pau, ex-secretário municipal de Obras; João Carlos Costa de Mello, "Cacau", ex- secretário municipal de Governo; Adalberto Martiniano Alves Junior - responsável pelo setor de compras da secretaria de Governo - e o vereador Ayron Pinto Freixo. Eles são acusados, juntamente, com Renatinho, de Corrupção Passiva (artigo 317 do CP) e fraude de caráter competitivo em processo licitatório (artigo 90 da Lei 8.666/93). Estes crimes são alvos de investigação em dois Processos de Investigação Criminal (2020.00020786), a cargo do MP, e do Inquérito Policial (921-00045/2019), pela Delegacia de Fazenda, o qual teve acordo de colaboração homologado pelo Supremo Tribunal Federal.

Propinas e eleições – O esquema criminoso foi montado pelo prefeito, segundo o MP, antes mesmo de ele assumir o cargo em janeiro de 2017. Renatinho teria combinado com os colaboradores de sua campanha, Paulo Roberto de Souza Cruz e Fernando Trabach Gomes, supostos benefícios em licitações, caso fosse eleito.

Fernando Trabach teria sido beneficiado em licitações para contratos de coleta de lixo e Paulo Roberto favorecido em serviços de iluminação pública. O MP tem depoimento de Fernando Trabach confirmando que pagou R$ 400 mil em propinas já no ano de 2017. O dinheiro foi parcelado em dez prestações mensais de R$ 40 mil entre os meses de janeiro e outubro daquele ano. "Essa tratativa se deu na presença do ex-secretário municipal de Governo João Carlos Mello, o "Cacau", que também participou do recebimento de importância indevidas", revela o MP em sua acusação.

Em outro crime de corrupção, já como prefeito, Renatinho solicitou 10%, "a título de vantagem indevida, para cada pagamento feito pelo Município de Arraial do Cabo relativo ao contrato (oriundo de fraude à licitação) para a prestação do serviço de coleta de lixo. Segundo o MP, os valores foram pagos em espécie (dinheiro) por Fernando Trabach Gomes e Fernando Trabach Filho, diretamente ao prefeito.

O MP apresenta como prova diálogos ocorridos em Watsapp sobre detalhes do esquema de corrupção envolvendo Renatinho, Cacau e os "colaboradores" de sua campanha. O MP apurou que Trabach Filho voou de helicóptero até Arraial do Cabo para pagar a propina em dinheiro ao prefeito. Quanto a Cacau, Trabach Filho disse ao MP que o secretário de Governo ia ao escritório da empresa "para pegar os valores combinados". O esquema de fraudes em licitação para beneficiar a empresa Líbano Serviço de Limpeza Urbana Construção Civil LTDA, de Fernando Trabach, tinha a participação direta de Renatinho e possivelmente de Cacau e do secretário de Obras, Carlos Roberto da Silva, o Pica-Pau, e de Adalberto, responsável pelo setor de compras da Secretaria Municipal de Governo. Esses agentes públicos teriam montado um esquema para que a Líbano fosse beneficiada em processo de licitação emergencial de coleta de lixo.

Vereadores – No depoimento ao MP, Trabach disse que o pagamento de propinas variava entre 300, 400 e 500 mil reais. Parte do dinheiro enviado ao prefeito era canalizado para alguns vereadores (o nome não foi revelado). Inclusive, uma taxa de proteção ambiental foi aprovada na Câmara, como parte de um acordo entre o empresário e o político.

A lista de crimes de Renatinho inclui mais uma propina, segundo o MP. Ele teria cobrado 10% de R$ 2 milhões referente à dívida que Arraial do Cabo contraiu com a Líbano. Isso foi sacramentado em um "Termo de Confissão de Dívida". "Pra ele me pagar R$ 2 milhões, eu teria que dar a ele R$ 200 mil", afirmou Trabach.

Iluminação Pública – O esquema de fraudes em licitação promovido pelo prefeito beneficiou outro colaborador de campanha, Paulo Roberto de Souza Cruz. Em 2016, durante a campanha eleitoral, o empresário procurou Renatinho, na época vereador, e seu colega parlamentar Ayron Pinto Freixo. O encontro ocorreu no comitê de campanha de Renatinho. A intenção de Paulo Roberto era apresentar um "projeto de eficiência energética". Sem cerimônias, o candidato a prefeito pediu R$ 15 mil mensais. Já Ayron, receberia R$ 5 mil. O dinheiro foi pago, segundo o colaborador, entre maio e setembro daquele ano. O valor era entregue em frente à Prefeitura de Iguaba Grande, local aliás, da conveniência de Ayron. Como contrapartida, ele "montaria uma licitação" para que a empresa Compilar, de Paulo Roberto vencesse a futura licitação.

Um mês depois das eleições, em novembro de 2016. Paulo Roberto vai à casa do prefeito eleito. Lá, segundo o MP, Renatinho teria dito que a "transição do governo estava difícil", mas teria prometido novo contato . A intenção do novo governo era fazer um contrato emergencial referente a serviços de iluminação pública. Como de costume, Renatinho pediu outra propina. Agora de R$ 15 mil. O dinheiro era para cobrir as despesas de campanha do colega Ayron, também reeleito. Palavra dada, palavra cumprida. O dinheiro foi pago, segundo Paulo Roberto, em sua casa, em Niterói.

Em dezembro daquele ano, por intermédio de Pica-Pau, Paulo Roberto, foi informado de que os serviços de iluminação não seriam feitos pela Compilar, porque o prefeito teria que cumprir compromissos com outros colaboradores de campanha, mesmo assim outro contrato foi prometido.

Em janeiro de 2017, Renatinho toma posse como prefeito e Ayron, presidente da Câmara de Vereadores. Ele procurou o prefeito para cobrar o contrato emergencial, mas soube que os serviços de iluminação seriam dados para Fernando Trabach. Paulo Roberto disse ao MP que Trabach lhe contara que havia pago R$ 600 mil ao prefeito como apoio a campanha eleitoral.

O empresário foi serenado por uma promessa de que seria beneficiado em projetos de emenda parlamentar dos então deputados federais Marcelo Jandre Delaroli e Rosângela de Souza Gomes, que totalizariam R$ 900 mil. Paulo Roberto disse que procurou os deputados e que estes concordaram que essas verbas seriam destinadas à Compilar. O que não aconteceu. Foi por causa da suposta participação dos deputados nas questões envolvendo a contratação da Compilar que tornaram possível a homologação do STF, já que este é o foro para julgamento dos parlamentares.

As esperanças de Paulo Roberto não terminaram. Em junho, ele foi beneficiado, de acordo com o MP, pelo prefeito em contratação de compra de lâmpadas e reatores. Para isso foi montado um novo esquema tendo a participação de Cacau, secretário de Governo. A reunião ocorreu na própria Secretaria. Coube a Adalberto Martiniano a tarefa de "montar a licitação".

"Cacau sabia que a licitação seria direcionada à Compilar, e que fariam na modalidade convite, com dispensa de licitação", revela Paulo Roberto em seu depoimento ao MP. Como já havia um contrato emergencial em vigor, o empresário sugeriu que a licitação fosse feita no modelo "convite" para a alocação de equipamentos e mão de obra e, em paralelo, a montagem de outro processo licitatório para o serviço, o que seria mais demorado. O objetivo era que, ao final desse convite, em 60 dias, a licitação já tivesse terminada e a Compilar contratada.

- Adalberto fez a proposta ao depoente (Paulo Roberto) para que este pagasse R$ 50 mil em troca da publicação do edital de licitação no jornal "O Dia", com a compra de toda a tiragem (exemplares) daquele dia para que houvesse a prova de publicação, mas para que as empresas concorrentes não soubessem do edital, ou ao menos para que diminuísse a quantidade de concorrentes -, revela o MP.

Paulo Roberto chegou a executar os serviços por 60 dias, mas, segundo ele, nada recebeu. Ele foi preso em agosto de 2017 por conta da "Operação Apagão", coordenada pelo Ministério Público.

Todas as acusações a Renatinho e o seu suposto bando foram compiladas em uma peça jurídica de 44 páginas. O pedido de busca e apreensão foi protocolado pelo Ministério em 17 de julho.

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